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Porque é que o novo rebranding da Jaguar é um erro

Late to the party!

Já sabia que as coisas na Jaguar não andavam famosas. As vendas estavam em queda livre, não havia novidades relevantes nem modelos novos para manter o público interessado ou o portfólio atualizado. Por isso, foi com algum espanto que recebi a notícia de que a Jaguar decidiu, há alguns meses, parar de produzir carros e liquidar o inventário existente. A razão? Focar-se inteiramente no rebranding e na nova direção estratégica que iria tomar no futuro.


Confesso que nunca tinha visto nada semelhante na indústria automóvel. Só podia significar que estavam a preparar algo verdadeiramente especial. Mas, no dia 19 de novembro, quando o tão esperado rebranding foi finalmente revelado... fiquei profundamente desiludido. Para mim, este novo rebranding é, no mínimo, um erro estratégico.

Sei que estou atrasado para esta discussão e que o tema já não está "na moda". Contudo, como alguém que possuí uma pós-graduação em Branding e experiência prática nesta área, sinto que é hora de partilhar a minha opinião honesta sobre o novo rumo da Jaguar.

Stop smelling your own farts

Desde o dia 19 de novembro, tenho lido opiniões de profissionais de Marketing e Branding, jornalistas e até algumas celebridades. A maioria dessas opiniões, na minha visão, é pura "treta" — ou, como diriam os britânicos, "bollocks".


Os profissionais que defendem este redesign parecem esquecer-se de que um rebranding eficaz não se resume a pintar tudo de uma nova cor, criar um logótipo atualizado ou mudar a tipografia. O problema da Jaguar nunca foi o Branding. O logótipo, o jaguar em si ou o tipo de letra não eram os culpados. O verdadeiro problema está, há anos, nos produtos.

A Jaguar não consegue competir com a concorrência. A sua mensagem de luxo britânico não combina com a qualidade dos seus automóveis. Os últimos modelos têm sido atormentados por problemas de fiabilidade e continuamente superados pela concorrência em especificações e preços.

Se um especialista em Marketing defende esta estratégia sem analisar o panorama geral e sem focar no essencial — o produto — demonstra uma grave falta de visão sobre o verdadeiro papel do Branding numa empresa. Rebranding não é lançar um vídeo estilizado com modelos que parecem saídos de uma passerelle. É criar uma ligação genuína entre a marca e o que ela representa. E isso começa no produto.

O peso da história.

A Jaguar tem muita história, tem anos e anos de inovação e excelência técnica britânica, tem anos e anos de vitórias importantíssimas em desportos motorizados como por exemplo ganhar 7 vezes as 24 horas de Le Mans. Criou lindíssimos carros como o E-Type, carros super inovadores como o XJ220 e carros espectaculares como o F-Type SVR e o Jaguar XE SV Project 8. Para uma marca de automóveis querem melhor imagem de marca do que isto? E agora? Parece que todo esse património foi descartado para dar lugar a um rebranding vazio.

O que a Jaguar precisa não é de uma mudança cosmética, mas que os executivos da TATA, (donos da Jaguar), deviam realmente apostar na tecnologia e no desenvolvimento de automóveis fiáveis e inovadores para bater certo com a iamgem que a marca passa cá para fora. A bota tem de bater com a perdigota. Para mim o último grande Jaguar a ser feito foi o F-Type e esse carro causou bastante sensação e até era fiável. Mas todos os outros modelos e principalmente o i-Pace que é o primeiro produto 100% elétrico da Jaguar, é um pesadelo, conheço muitas pessoas que compraram um e estão muito insatisfeitas. 

Muitos dos meus colegas de marketing dizem, "Ah, mas não viram o Briefing por isso o que tá feito até pode estar correto". Não meus amigos. Imaginem isto. Uma casa é construída e de repente começa a chover dentro de casa, vocês aí também vão dizer, "Ah, mas se calhar está correto porque no projeto isso pode ter sido pedido assim". Obviamente que não... não é suposto chover dentro de casa. Aqui no caso da Jaguar, não era suposto atirarem com todo o legado e história da marca para o lixo e começar todo de novo.

Outro exemplo, o Doug Demuro que acha que a Jaguar fez bem mudar a marca porque já não se lembra da última vez que viu tanta gente a falar da Jaguar. Okay... realmente é verdade, mas isso é como dizer que nunca viu ninguém a falar tanto da Coca-Cola quando lançou a New Coke, que como todos sabem, foi um desastre espetacular. Por vezes dizem, falar mal ou bem, o que interessa é que falem. Eu sinceramente, acho que neste caso, isso não se aplica.

Imaginem se a Porsche tivesse feito isto no final da década de 90?

Talvez o que me deixa mais perplexo nisto tudo, é que ao longo da história existiram muitos construtores de automóveis que tiveram mais do que uma vez à beira da bancarrota, a Porsche, Maserati, Ferrari, Aston Martin, Bentley... A lista é infindável. Agora imaginem o que era se a Porsche na década de 90 tivesse feito a mesma coisa. Deitado para o lixo décadas do seu legado e tivesse feito um rebranding como o da Jaguar. Teria sido, provavelmente, o fim da Porsche. E quem diria que o que tirou a Porsche do lodo, não foi um rebranding, mas sim a aposta produtos novos com qualidade que trouxeram um novo grupo de consumidores que até lá nunca teriam pensado em comprar um Porsche? Cayenne foi um deles, e todos os outros carros mais práticos que a Porsche lançou lançaram a marca para a estratosfera, mantendo vivo o Porsche 911 e toda a sua aura de marca desportiva ligada ao desporto motorizado. E não foi lançar um SUV por lançar, foi lançar um SUV da Porsche com toda a técnica e sabedoria da Porsche no off-road e em produtos de luxo desportivos.

Produto é a chave


Dia 2 de Dezembro foi apresentado o concept car Type 00 que iria ditar a nova linguagem de design dos produtos da Jaguar no futuro. Apesar de não ser efetivamente feio, também não é bonito, tem algumas características e opções de design que não são práticas (o que é normal num concept), mas quão aproximado está este concept car da versão de produção? E quanto tempo vão demorar a colocar esta nova geração de carros nos stands para as pessoas comprarem? 

Em termos de especificações do carro, sabe-se muito pouco. Para além das jantes de 23 polegadas e o facto do carro não ter vidro traseiro, apenas se sabe que o carro vai ser construído numa nova plataforma e que os engenheiros têm como objectivo uma autonomia de cerca de 700 km. Porquê a falta de especificações técnicas? Bem, segundo a gerência da Jaguar... 

Os novos consumidores não se interessam pela parte técnica dos carros


Os consumidores do mercado de luxo não querem saber de cavalos, nem de binários, nem de tempos de carregamento, nem de tipos de suspensão... São criaturas que compram um carro como se tratasse de uma mala da Gucci ou um casaco da Prada. Vêm na montra, gostam, e pagam 5000€ pela peça. Isto pode ser verdade para uma mala, mas para um carro de luxo? Acredito piamente que não será o caso. O tipo de pessoas que compram estes artigos de luxo, algumas vezes podem não perceber de carros, mas com certeza conhecem e vêm outras pessoas que percebem a falar sobre aspetos técnicos e seguir esses conselhos. A Porsche disponibiliza uma quantidade incrível de informação técnica sobre os automóveis e continua a bater recordes de vendas. Os G-Wagon não são só famosos porque as celebridades têm um, mas a razão porque têm um é porque são carros bem construídos, com especificações de sonho e um design icónico. As "Reasons Why" (um termo de publicidade), sobre comprar um carro de uma determinada marca têm de ser muito mais profundas do que apenas e passo a citar um dos parágrafos dos quilómetros de texto a dizer nada sobre o Type 00: 

"Apresentamos uma manifestação física inconfundível, inesperada e dramática da Jaguar, à medida que a marca continua a sua transformação. O Type 00 (pronuncia-se Type Zero Zero) incorpora a filosofia criativa de Modernismo Exuberante da Jaguar, após a estreia da sua nova identidade de marca.

Let them peasants buy electric cars

Para uma marca sair do buraco, tem de saber ler o mercado e para onde ele está a ir e depois de meses a ver os executivos da Jaguar a pensar em luxúria, cores berrantes e logótipos a imitar uma qualquer marca de "luxo" ou "lixo", tomaram a decisão de fazer com que a Jaguar fosse uma marca 100% elétrica. Uma escolha curiosa, pois muitos consumidores de luxo não querem lidar com as limitações de autonomia e carregamento dos elétricos. E claro, desde o início do ano que as vendas dos carros 100% elétricos estão em queda e já fez com que muitas marcas de luxo mudassem os planos de ter um line-up 100% elétrico, como a Volvo e a Lotus. 

Eu tenho uma teoria, sobre quem é que vai comprar elétricos e plug-ins ou carros a combustão no futuro. Quem é rico, vai comprar carros plug-in ou a combustão porque mesmo que a gasolina fique a 8€ o litro, não faz diferença. As pessoas de classe média ou pobres, vão ter de comprar carros elétricos porque será incomportável o custo dos combustíveis fósseis e vão ter de lidar com todas as suas inconveniências.

Desde o anúncio do novo rebrand as coisas melhoraram para a Jaguar?

Para além de terem polarizado a opinião das pessoas sobre esta marca, a verdade é que não... as coisas não melhoraram e as vendas dos carros que a Jaguar ainda tem em stock caíram 9% desde que foi anunciada a nova marca da Jaguar ao mundo. 

Keep calm, and carry on?


No final, tenho de dizer que o que está a acontecer à Jaguar como marca é um desastre. Até os chineses quando compraram a MG, não mudaram a marca dramaticamente (porque ela tem um grande legado e história) e também a ideia deles é serem 100% elétricos. Podia ser uma boa ideia a Jaguar ter feito o mesmo? Não sei, mas espero sinceramente que toda esta associação da marca à arte e moda (coisa que a DS Automobiles já faz), seja realmente a resposta para tirar a Jaguar do lodo. Resta-me esperar estar errado. Seria surpreendente e maravilhoso ver a Jaguar renascer como um exemplo de sucesso com este rebranding. Mas, honestamente, o que vejo agora é uma receita para o fracasso.


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